A água de coco e a flexbilização de nossa consciência
Por Edgar Cantelli
Um dos princípios mais importantes da Medicina Chinesa é o da
interdependência e relatividade dos fatores que alteram beneficamente ou
patologicamente a nossa fisiologia. Em outras palavras: praticamente qualquer
tipo de recomendação ou orientação pode fazer bem ou mal ao indivíduo,
dependendo de outros fatores que compõem o seu quadro.
A relevância dessa compreensão, não somente para os terapeutas, mas também
para a população em geral, me ocorreu hoje durante um atendimento no qual uma
paciente, que vinha num quadro bastante estável, apresentou abruptamente um
Padrão de alteração fisiológica de Frio Interior. Essa é uma terminologia da
Medicina Chinesa para falar de uma desaceleração das nossas funções orgânicas
(que chamamos de nosso aspecto Yang), manifestando sintomas como
cansaço, letargia, respiração curta, perda de fezes, sensação de frio no corpo,
dentre outros sintomas. Durante a entrevista ficou claro que o Padrão havia se
estabelecido após a paciente ingerir uma quantidade acima do normal (dentro da
sua rotina) de água de côco. Expliquei para a paciente que a água de côco tem
uma natureza muito fria e que, numa época do ano fria, como a que estamos, numa
pessoa que, como ela, apresenta uma tendência ao desenvolvimento de Padrão de
Frio Interior, especialmente do trato digestório, poderia desencadear esse
processo.
Ela então me relatou o seguinte: nós ouvimos falar dos benefícios da água
de côco e pensamos que ela sempre nos fará bem. Daí nasceu a motivação para esse
artigo pois o entendimento da Medicina Chinesa é muito diferente. Praticamente
tudo que existe na natureza pode nos fazer bem, se usado no momento adequado e
na quantidade adequada, assim como tudo pode nos fazer mal, se usado no momento
inadequado e na quantidade inapropriada. E o entendimento desse momento não é
somente relativo a estação do ano, ou a temperatura do dia, mas também, e
especialmente, o momento de vida, a situação fisiológica como um todo, que o
indivíduo vive naquele momento. Ou seja, mesmo num período frio, para um
paciente que apresenta uma Síndrome de Fogo, ou seja, uma grande hiperatividade
interna, a água de côco pode ser recomendada.
E essa é uma das grandes maravilhas, mas também uma das grandes
dificuldades de entendimento, da medicina chinesa: a da relatividade dos
fatores. Isso se aplica à alimentação, mas também aos tipos e quantidades de
exercícios físicos e energéticos, aos pontos da acupuntura, à fitoterapia, e
todas as outras ferramentas desta Medicina. Até mesmo o sol, que é muito
recomendado como uma fonte natural de geração de Yang, em excesso, pode secar os
Fluídos da pele, gerando um Padrão de Secura, gerando o envelhecimento precoce
do tecido e favorecendo a formação de tumores. Esse efeito fica incrivelmente
claro na foto (abaixo) publicada pelo site “The New England Journal of
Medicine” que mostra o caso de um senhor que dirigiu um caminhão de
entregas por 28 anos, pegando sol no lado esquerdo do seu rosto diariamente e
sem proteção.
Por isso torna-se tão importante que, durante um tratamento de Medicina
Chinesa, o terapeuta investigue todos os hábitos relevantes de seu paciente, mas
também que, sabendo das interdenpendências da nossa saúde, o paciente lembre-se
de falar de qualquer hábito ou rotina em qualquer aspecto de sua vida, mesmo
que, num primeiro momento possa não ver relação com a sua doença. Aí pode estar
a chave do seu tratamento.